Qual o risco de grandes enchentes na primavera de 2025
Histórico recente de extremos climáticos no Rio Grande do Sul mantém alerta, embora projeções indiquem risco menor do que em 2023 e 2024

O Rio Grande do Sul voltou a viver cenas de alagamentos neste fim de semana. Em São Lourenço do Sul, o transbordamento do Arroio São Lourenço atingiu cerca de duas mil casas e levou o município a decretar estado de calamidade. O episódio se soma a uma sequência de enchentes nos últimos anos que colocam em debate o risco de novos desastres ainda em 2025, especialmente durante a primavera.
Um histórico recente de cheias
Segundo a MetSul Meteorologia, nos últimos três anos, o estado sofreu com enchentes de grande impacto.
- 2023: marcado por sucessivos eventos. Em junho, um ciclone no Litoral Norte causou 16 mortes. Em setembro, a catástrofe no Vale do Taquari deixou mais de 50 vítimas e o Guaíba ultrapassou a cota de inundação pela primeira vez desde 1967. Dois meses depois, em novembro, Porto Alegre voltou a registrar cheia histórica, com o nível do Guaíba chegando a quase 3,5 metros.
- 2024: entre abril e maio, o Rio Grande do Sul enfrentou o episódio mais grave. Volumes próximos de 1.000 mm de chuva em poucos dias provocaram deslizamentos e o transbordamento de rios como Jacuí, Caí, Taquari e Sinos. O Guaíba atingiu 5,13 metros no Cais Mauá. Foram 185 mortes confirmadas, além de óbitos ligados à leptospirose.
- 2025: já foram registradas três cheias. Em junho, a mais significativa: o Jacuí em Cachoeira do Sul alcançou a segunda maior cota de sua história, igualando a de 1941. Agora, em agosto, foi a vez de São Lourenço do Sul decretar calamidade.
O que esperar da primavera?
A primavera é historicamente uma estação de risco para grandes enchentes no Sul, como em setembro e novembro de 2023. Entretanto, as condições climáticas deste ano indicam um cenário menos extremo:
- O Oceano Pacífico está em fase de neutralidade (-0,3ºC no índice Niño 3.4). Há tendência de resfriamento nos próximos meses, o que pode levar à instalação de uma La Niña fraca.
- Sob condições de neutralidade ou La Niña, o risco de grandes enchentes é menor do que em anos de El Niño, quando o Pacífico está aquecido.
- Modelos climáticos apontam para uma primavera com chuva abaixo da média na maior parte do Sul do Brasil. Uma exceção é o Noroeste gaúcho, onde pode chover acima da média.
O alerta continua
Apesar do cenário menos preocupante, especialistas chamam atenção para um fator decisivo: a atmosfera global mais quente retém mais vapor d’água, o que favorece episódios de chuva intensa mesmo sem El Niño. Prova disso foi o ocorrido em junho deste ano, quando, em condições de neutralidade, o Jacuí alcançou marcas históricas.
Outro ponto a ser monitorado é a Oscilação de Madden-Julian (OMJ). Modelos climáticos sugerem que o fenômeno terá fase ativa sobre a América do Sul na segunda metade de setembro, aumentando o risco de temporais e chuva volumosa no Sul do país.
Tradição e memória: a enchente de São Miguel
No imaginário popular gaúcho, o dia 29 de setembro, dedicado a São Miguel Arcanjo, é cercado de crenças sobre enchentes. A chamada “enchente de São Miguel” se consolidou como referência cultural, transmitida por gerações de agricultores e ribeirinhos.
A tradição diz: “se chove em São Miguel, o verão será molhado; se o tempo firma, vem seca pela frente”. Embora a Meteorologia moderna explique melhor os fenômenos, a crença segue viva como parte do folclore gaúcho.
Conclusão
As enchentes de 2023 e 2024 dificilmente se repetirão na mesma intensidade neste ano, mas o Rio Grande do Sul permanece vulnerável. A combinação entre clima instável, excesso de vapor d’água na atmosfera e oscilações sazonais faz com que a possibilidade de eventos extremos não possa ser descartada.
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