Bolsonaro nega tentativa de golpe e se defende no STF: ‘Nunca cogitei romper com a Constituição’
Durante o interrogatório, Bolsonaro também refutou relatos de que teria recebido apoio das Forças Armadas para um possível golpe

Em um dos interrogatórios mais aguardados do processo que apura uma suposta trama golpista para impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-presidente Jair Bolsonaro prestou depoimento nesta terça-feira (10/06) ao Supremo Tribunal Federal (STF) e negou ter articulado qualquer tentativa de ruptura institucional durante seu governo. “Da minha parte, nunca se falou em golpe. Golpe é abominável”, afirmou Bolsonaro ao ministro Alexandre de Moraes, relator da ação penal.
Na condição de réu, Bolsonaro buscou rebater as principais acusações feitas contra ele pela Procuradoria-Geral da República (PGR), entre elas a de que teria participado da elaboração de uma minuta de decreto com propostas de intervenção militar e prisão de ministros do STF. O ex-ajudante de ordens Mauro Cid, delator no processo, afirmou em depoimento que Bolsonaro teria sugerido alterações nesse documento, incluindo a prisão de autoridades. O ex-presidente, no entanto, negou qualquer envolvimento com o texto: “As informações que eu tenho é de que não tem cabeçalho nem fecho. Isso não procede.”
Negativas sobre apoio militar e operação da PRF
Durante o interrogatório, Bolsonaro também refutou relatos de que teria recebido apoio das Forças Armadas para um possível golpe. Segundo investigação da Polícia Federal, o então comandante da Marinha, Almir Garnier, teria colocado as tropas à disposição do ex-presidente em 2022. Questionado diretamente sobre o tema, Bolsonaro foi taxativo: “Em hipótese alguma. Não existia clima, nem base para qualquer coisa desse tipo.”
Outro ponto abordado foi a operação da Polícia Rodoviária Federal (PRF) no segundo turno das eleições de 2022, que teria dificultado o deslocamento de eleitores no Nordeste. Bolsonaro alegou desconhecimento prévio da ação e minimizou seu impacto: “Fiquei sabendo depois e, pelo que me informaram, ninguém deixou de votar.”
Urnas, voto impresso e tensão com o STF
Em relação às constantes falas públicas questionando a lisura das urnas eletrônicas, Bolsonaro manteve sua defesa. Afirmou que sempre defendeu o voto impresso como forma de auditoria, mas garantiu que nunca tomou medidas fora do escopo constitucional. “Joguei dentro das quatro linhas o tempo todo”, declarou.
O ex-presidente também recuou em declarações polêmicas do passado. Diante da cobrança sobre acusações de corrupção contra ministros do STF, Bolsonaro pediu desculpas. “Não tem indício nenhum. Me desculpe, não tinha intenção de acusar qualquer desvio de conduta”, disse.
Reuniões com comandantes e a suposta voz de prisão
Bolsonaro negou com veemência ter recebido voz de prisão do então comandante do Exército, general Freire Gomes, durante uma reunião com chefes das Forças Armadas. A reunião, segundo as investigações, teria sido palco de tensão entre militares e Bolsonaro, quando foram discutidas possibilidades de impedir a posse de Lula. O ex-presidente desmentiu o relato do ex-comandante da Aeronáutica, brigadeiro Baptista Júnior, que havia confirmado a ameaça de prisão. “As Forças Armadas sempre primaram pela disciplina e hierarquia”, disse Bolsonaro, que ainda sugeriu que teria substituído o comandante caso houvesse uma conspiração nesse sentido.
Freire Gomes, em depoimento anterior como testemunha, também negou ter dado voz de prisão, mas confirmou ter alertado Bolsonaro sobre os riscos jurídicos de qualquer medida inconstitucional.
Reta final do processo
O interrogatório de Bolsonaro é parte da última etapa do processo que reúne oito réus apontados como integrantes do “núcleo duro” da tentativa de golpe. Já prestaram depoimento Mauro Cid, Alexandre Ramagem (ex-diretor da Abin), Almir Garnier, Anderson Torres, e Augusto Heleno. Ainda serão ouvidos o general Walter Braga Netto e o ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira.
A expectativa é que o julgamento ocorra no segundo semestre de 2025. Se condenado, Bolsonaro poderá pegar mais de 30 anos de prisão, somando os crimes de associação criminosa, tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
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