João Adolfo Guerreiro
JOÃO ADOLFO GUERREIRO | A chuva voltou a molhar as ruas da cidade
Voltarei a ser totalidade, natureza, nela diluído

João Adolfo Guerreiro
A chuva veio, conforme o previsto, enquanto o frio parte. A água que cai do céu molha o asfalto irregular e remendado das ruas de Charqueadas. Precipita-se sobre os telhados das casas e pinga nas calçadas, produzindo aquele barulhinho ninante e contínuo, bem característico. Dizem os entendidos que setembro será chuvoso por aqui, o que nos causa preocupação desde maio do ano passado.
Indiferente a nossos temores, o Jacuí segue o seu curso, aditivado, fonte de vida: a chuva é sua amiga, sua fonte. Do porto da Gerdau olho para o grande manancial em movimento (foto abaixo) e penso sobre possíveis metáforas, mas não sou poeta, sou cronista, e estes devem conversar, prosa, não poetizar, verso. As nuvens acariciam a superfície do rio com o maná dos céus enquanto estou ali, sem importância, utilidade ou significado algum. Sou tão somente dois olhos que veem, um corpo que sente e um cérebro que pensa, um entre tantos, tão igual aos outros. Passageiro.
Em um breve tempo para o rio, esse guardião dos séculos e milênios, desaparecerei. Virarei pó, não água, embora meu corpo seja 70% água. Talvez a água que sou, de alguma forma, evapore pras nuvens um dia e vire chuva setembrina sobre este mesmo rio, tornando-me carícia e fonte. Assim, subirei aos céus e descerei também para a terra, molhando as ruas de Charqueadas. Voltarei a ser totalidade, natureza, nela diluído.
Voltaremos. Todos nós.
Ficou filosófico e poético. Não era a intenção. Juro. Culpa do gotejar ninante e embriagante.
Vai um café passado? Vou esquentar a água.
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